O ritual do chimarrão
A infusão da erva-mate em porongo com bomba de taquara foi assimilada pelos colonizadores, que enfeitaram os apetrechos de tomar a bebida
Pollianna Milan e Leandro dos Santos
No começo do século 20, o hábito de tomar mate se espalhau na elite, principalmente da Região do Prata, transformando em algo luxuoso o simples ato de beber a infusão. As mulheres se reuniam para tomar mate e ostentavam às visitas as cuias adornadas com pedras e feitas de ouro e prata. Havia cuias produzidas em vidro e louça. As de porcelana pintada eram usadas principalmente para tomar mate com leite em vez de água. Acreditava-se que tal combinação estimulava a lactação.... Continue lendo
A chaleira também era requintada, de cobre importado da Catalunha ou de prata encomendada de Lima – esta última foi usada como precursora da garrafa térmica, pois as mulheres jogavam brasas dentro do recipiente, mantendo a água quente, segundo relata Newton Carneiro em “O mate nas artes luso-brasileiras”. Muitas casas também passaram a ter móveis próprios para a hora de tomar chimarrão (cadeiras e mesas mais baixas, adornadas com folhas de mate esculpidas na madeira). Outro utensílio criado foi uma espécie de estojo para armazenar a erva-mate pronta para consumo. Eram verdadeiros porta-joias. Carneiro descreve que artistas e ourives aplicaram seus dotes para desenvolver utensílios e móveis para a tradição mateira.Inovações
A erva de chimarrão, até a década de 1970, era amarelada. Ficava assim porque passava por um período de repouso de, no mínimo, seis meses. Hoje, sem descanso, ela é consumida ainda verde. Na Argentina, a erva repousa por um ano e meio, ao menos.
Um assemelhado do chimarrão é o tererê, uma infusão com água gelada. Esse tipo de bebida é muito consumido em regiões mais quentes, como Mato Grosso do Sul e Paraguai. Atualmente, há nas gôndolas dos mercados uma variedade de tipos de erva: compostas com plantas medicinais; embaladas a vácuo (para melhor conservação do produto); com aroma artificial de fumaça (já que se fosse defumada naturalmente seria cancerígena) e com açúcar (mesmo com o inconveniente de aumentar a fermentação). Em 1938, o lançamento do chá mate tostado, pela Leão Júnior, ampliou mais o mercado para a erva-mate. O mate gelado – lançado também pela empresa no Rio de Janeiro – ganhou as praias cariocas e o coração dos torcedores: na inauguração do estádio do Maracanã, o que se ouvia nas fileiras das arquibancadas era o vendedor gritando “olha o mate”.
Do extrato feito a partir da erva-mate surgiram novos produtos. A planta apresenta propriedades estimulantes, cicatrizantes, digestivas e diuréticas. É usada em bebidas energéticas; medicamentos; produtos de higiene e beleza; tinturas e corantes; cervejas, vinhos, refrigerantes e licores; suplementos alimentares; e sorvetes. A Alemanha inovou também ao patentear o extrato da erva para a tinta de cabelo, para fugir dos amoníacos que queimam o couro cabeludo.
Segundo Jorge Mazuchowski, engenheiro agrônomo da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-PR), atualmente apenas 10% da produção brasileira de erva-mate é exportada e, do que é consumido internamente, 70% vai para o preparo de chimarrão ou tererê. O Paraná é o principal produtor, mas o maior consumidor é o Rio Grande do Sul. Inclusive, a associação que os gaúchos fizeram do churrasco com o chimarrão é muito conveniente: a carne demora para ser digerida e a erva-mate atua como digestivo. Apetrechos
A bomba
Antigamente essa parte era revestida em ouro, na crença de que o metal eliminaria micróbios.Tipos de bomba
Origens da bomba
Os índios Guaranis usavam uma bomba de taquara, a tacuapi (tacuá: cana oca; api: alisada). Somente prestava a parte entre os nós.Nos séculos 17 e 18, artesãos que trabalhavam com os jesuítas desenvolveram bombas de metal. Usavam latão e alpaca para as mais simples, e ouro e prata para as mais elaboradas. As de latão esquentavam muito.
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A cuia
Antes chamada de mate, a cuia é feita com um porongo, fruto de uma planta rasteira. Há vários tipos de cuia, de acordo com o formato do porongo e com o acabamento. O mais tradicional é o “pescoço” ou “beiço”.
Corte do porongo
Como o porongo vira cuia
Para ser utilizada pela primeira vez, a cuia precisa ser curtida ou curada.- Encha a cuia com uma mistura de erva-mate, cinza vegetal e água quente.
- Deixe por dois ou três dias para impreg-nar as paredes do porongo. A erva dá o gosto, e a cinza aumenta a resistência.
- Enxágue com água quente. À medida que ela vai sendo usada, os mates vão ficando melhores.
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A roda de chimarrão
A tradição de tomar chimarrão envolve familiares e amigos. No final das contas o mate acaba sendo um pretexto para as pessoas se encontrarem para conversar. Apreenda com uma animada roda de chimarrão como preparar a bebida e anote algumas dicas para não cometer nenhuma gafe na hora de tomar o mate.Boas maneiras
- Segundo tradição da época colonial, o primeiro mate é de quem o preparou, para mostrar que o chimarrão não foi envenenado. O segundo mate é da pessoa mais velha ou de alguém a quem se queira homenagear.
- Use a mão direita para receber ou entregar o chimarrão, caso contrário desculpe-se.
- Beba o mate até “roncar” (o barulho que a cuia faz quando fica sem água).
- Não agradeça ao receber o chimarrão. Faça isso caso esteja satisfeito e não queira mais.
- Se for necessário ajeitar a bomba ou a erva, quem deve fazer isso é a pessoa que preparouo chimarrão.
A erva-mate
Classificação
De acordo com a sua composição final a erva-mate, depois de cancheada e industrializada, pode ser classificada em três tipos:Chimarrão “medicinal”
Para fins terapêuticos ou apenas para acrescentar sabor diferente à bebida, muitas pessoas colocam plantas medici-nais entre a parede da cuia e a erva-mate, no espaço que é preenchido com água quente. Veja algumas opções:- Problemas digestivos e cólicas: boldo, camomila, erva-doce, macela, poejo e hortelã
- Tosse: guaco e poejo
- Calmante: camomila, erva-cidreira e hortelã
- Contra infecções: malva
- Reumatismo: aroeira
- Diurético: pata-de-vaca
- Vermífugo: hortelã
- Pedra nos rins: quebra-pedra
Alguém sabe me dizer onde posso comprar o Tacuapi (bomba) de bambu e o porongo? Grato.
ResponderExcluirPorongos são difíceis de encontrar mas pela internet é possível, e quanto ao bambu em lojas que vendam cuias.
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